terça-feira, junho 11, 2013

Não dito.

Texto em parceria com a escritora Maria Fernanda Probst.


Olhei-o pela octogésima vez. Durante semanas, ele fora deliberadamente gentil e doce e fofo e carinhoso e apaixonado comigo, me levando à bares, cinemas e bancos de praça. Eu me envolvia na velocidade da luz, porque não sei me envolver de maneira lenta. Triste mania de me jogar de cabeça em tudo que me convidam: me convidam para um relacionamento bobo, ok, mas me jogo de cabeça, alma e coração e, no caso dele que foi deliberadamente gentil e doce e fofo e carinhoso e apaixonado comigo, não podia ser diferente. Eu já o amava, e olhei-o pela octogésima primeira vez no meio daquele filme e engoli duzentas e trinta e duas vezes o “eu te amo” que queria dar um jeito de escapulir dos meus lábios.

O amor não é escambo – eu pensei. E enquanto eu meditava isso, pensava se era capaz de ouvir um: “valeu” ou algo do tipo: “que bom”. As pessoas não aceitam facilmente a rejeição e por que eu seria diferente? Eu ensaiava as palavras e os meus lábios entreabriram-se diversas vezes enquanto ele, com os olhos fixos no telão, sorria até perder o ar. E então eu analisava o efeito que o “não amar” dele surtiria sobre mim e sabia que o meu coração pesaria. E eu o olhava pela octogésima terceira vez.

Subitamente, ele pegou-me o olhando e riu. Puxou minha mão até seus lábios, beijou-a docemente e sorriu-me com os olhos nadando em estrelas. Derreti-me inteira e engoli as ditas palavras junto com o turbilhão de borboletas que se alvoroçaram cá dentro, deixando-me inebriada em felicidade palpável e notória. Virei-me, antes que fosse tarde demais, para o filme que não roubava nem um pouco a minha atenção.

O filme nada me atraia, isso era fato, mas pude notar alguma semelhança entre a personagem e eu. Ela também tentava confessar o amor e sempre era impedida. Ora pelo cara que cuspia, verborragicamente, vários empecilhos. Ora por ela mesma que se via tentada a dizer e sem coragem quando era possível. E enquanto via aquela situação só pude concluir, mentalmente, é claro: “como é difícil expressar o que sentimos.” E quando resolvi olhá-lo pela octogésima quarta vez ele me sorriu dizendo: “bobagem dele e dela não perceberem que amor é convivência, que ele se prova nas atitudes, no dia-a-dia e não apenas em um simples e formal: eu te amo. Nós, querida, não precisamos de verbos para amar um ao outro e ainda assim nos amamos. Profundamente.” Eu por minha vez apenas assenti. E senti.