sexta-feira, setembro 23, 2016

Falar sobre sentimentos que desatinam é inexorável


 – “Nunca me preocupei com alguém da forma que me preocupo contigo. Nunca fui cuidadoso com alguém assim, exceto a minha filha, e não sei explicar o motivo.”

Há palavras que precisam ser guardadas na memória, colocadas em uma caixinha, deixando-as intocadas no coração. Não porque elas não mereçam ser lembradas, mas para que não passem de bonitas à dolorosas. Para que elas não doam em nós. Para que elas exerçam o papel delas à época: “nos fazer felizes e amados”. Não há porque condenar e tentar esmiuçar cada frase e palavra dita. Não há porque olhar cada vírgula na tentativa de dizer se o que fora dito era real ou não. A gente sabe quando alguém é sincero.

Nós sabemos quando somos amados. Mas também sabemos o quanto as pessoas se perdem em meio aos sentimentos e desejos. Às vezes deixamos uma vida de lado para saciar uma vontade e um capricho do momento. Abrimos mão de uma felicidade duradoura por uma sensação momentânea. Fechamos os olhos para o que sentimos naquele momento e não nos damos conta do quão perigosa é aquela nossa aventura. Arriscamos perder. E, arduamente perdemos.

– “Eu soube que era você quando vi a minha felicidade no seu sorriso”.

Não há que se questionar das verdades ditas. Apesar da cabeça embaralhar e o coração se recusar acreditar. Você fecha os olhos e vê a pessoa nitidamente olhando para você. Com os fixos. Com o sorriso nos lábios. Repetindo inúmeras vezes o quanto te ama e o quanto deseja ter filhos contigo. Você se transporta para cenas vividas, se recorda dos risos e gargalhadas. Da forma que a pessoa tinha você dentro dos olhos, dos suspiros e das músicas que ele lhe cantava todas as noites. A sua cabeça vira uma radiola e as canções já não são cantadas por seus interpretes. É a voz dele que ressoa, que ecoa em sua mente. É a voz dele que, apesar de não cantar, te cantava todas as noites. Que te cantava sobre felicidade, sobre casamento, sobre “como era bom te ver”.

Olhando para nós. Para mim. Para você. Eu me recuso a acreditar que não tenha havido verdade nas palavras. Que o nosso sentimento tenha sido fictício ou que eu tenha me apaixonado por um personagem. Poucas são as pessoas que têm a graça de encontrar alguém que as completem, que sejam incríveis umas com as outras e que adivinhem cada pensamento. Poucas são as pessoas que te alertam seus horários de remédios, que insistem para você comer ou que te adulem a se cuidar. E assim ele fazia. Amava como amava uma filha. Amava como amava alguém que era importante e que queria para sempre na vida.

Falar sobre sentimentos que desatinam é inexorável. E, apesar disso a gente fala. Falamos para que os ouvidos ouçam e a mente se convença de que nada foi em vão. A gente fala na esperança de acordar e saber que é apenas um pesadelo. Esperando que o amor venha até nós e nos convença que estávamos errados e que há apenas uma falha na comunicação, que houve apenas um mal entendido. Que o amor existe, existiu e existirá. A gente tenta se convencer que as palavras não eram apenas bonitas, mas eram reais.

Eu mergulho em meu interior, fecho os olhos e penso: “que sorte a nossa termos nos encontrado e termos crescido tanto”. O crescimento que há em nós são os frutos dos dias que vivemos. Há história. Porque histórias não se resumem à carne, ao tato, ao sexo. Amor é muito mais que isso. Amor é compreensão, é reciprocidade, é amizade, é levantar o outro na queda, é torcer pela felicidade do outro, é cuidado diário. Eu me recolho em mim e penso que – apesar dos pesares – houve amor. Pelo menos da parte pela qual eu posso afirmar: de mim. Dedicação é amor. Ouvir é amor. Abraçar a dor do outro é amor. Enxugar as lágrimas do outro é amor.

E, embora estejam esperando de mim um texto choroso sobre o amor. Um texto que pragueje e maldiga o que vivi. Eu só posso escrever sobre gratidão. Porque eu repito – poucas pessoas na vida têm o privilégio de conhecer o amor. De vivê-lo. E eu vivi. E desse amor aprendi a me amar mais, a me querer mais, a me desejar mais. Desse amor eu aprendi o quanto eu era bonita, o quanto os meus olhos também são, o quanto minha sobrancelha também é. O quanto eu mereço a felicidade.

Não há o que se entristecer diante disso. Não há o que se enraivecer diante de tudo. O amor tudo perdoa, tudo crê e tudo espera. E, o seu perdoar não significa esquecer ou desejar viver novamente ao lado do outro. Não significa apagar da memória ou ter amnésia. Significa olhar para o outro com olhar de misericórdia e entender que a humanidade dele o venceu; é olhar para o outro e dizer: “eu entendo você, porque eu também erro”. É abraçar o outro e reconhecer que todo mundo tem a capacidade de magoar alguém. É pegar a pedra de condenação e atirá-la no chão, porque o amor sempre é o vencedor.

O amor tem o poder não somente de transformar pessoas, mas de modificar situações. Às vezes uma pedra de tropeço vem para nos fazer refletir sobre quem somos e/ou quem estamos sendo um para os outros. Toda queda traz lição. Toda cicatriz nos lembra dessa queda. Quem sabe esta minha queda me ensine a ser alguém melhor. Quem sabe a queda dele o ensine a amar com mais cuidado. Quem sabe essa situação não esteja aí para o nosso crescimento como ser humano.

Hoje eu olho, criticamente, para o que eu trago no peito e digo que valeu a pena. Cada risada, cada lágrima, cada bom dia e boa noite. Hoje eu olho para o sentimento que – apesar de anestesiado – se mantém bonito e intacto. Porque aprendi nestes dez meses o amor que Coríntios dizia. Porque aprendi a reconhecer a nossa fragilidade e olhar carinhosamente, compreensivamente, para os erros do outro. Uma mãe ama verdadeiramente um filho, o repreende, mas nunca deixa de amar. Assim, é o amor verdadeiro. E, entendendo essa máxima eu afirmo: o amor tudo perdoa. E, se não perdoar não é amor.


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